Diário de bordo: Wits University – Johannesburgo

Por Djamila Ribeiro
Esse texto era para ser um post no Instagram, mas me empolguei. Em vez de me limitar, decidi publicá-lo pela primeira vez no meu site — e gostei da ideia. Farei mais vezes.
Dizer que é “o primeiro evento da história” é sempre arriscado. O povo brasileiro é construtor de pontes e temos uma longa tradição de intelectuais cujas obras, traduzidas, atravessaram mundos e tempos. Ainda assim, e seguindo a afirmação do próprio ministro conselheiro do Brasil na África do Sul, o querido Murilo Komniski, fui a primeira pessoa escritora brasileira a realizar um lançamento de livro na África do Sul.
Foi o que aconteceu ontem, quando o Brasil escreveu uma página importante na Wits University. Com sua história centenária, papel central na luta contra o apartheid e excelência acadêmica, a Wits é uma das universidades mais relevantes do mundo. Com apoio do Departamento de Antropologia e da Embaixada do Brasil, lancei Where We Stand — edição em inglês do meu livro Lugar de Fala, com prefácio de Chimamanda Ngozi Adichie e introdução inédita. O evento estava lotado e tive a honra de compartilhá-lo com artistas baianos contemplados por políticas públicas de cultura do Governo do Estado da Bahia (@flotar_).
Fiquei particularmente tocada ao encontrar Manoela Ramos, conhecida pela conta @escritoraviajante. Manoela é uma das organizadoras da Feira do Livro da Ilha de Boipeba, na Bahia, e participou de trocas muito preciosas durante o evento. Eu mesma me comprometi publicamente: estarei nesse festival em 2026 e terei a honra de conhecer a comunidade quilombola onde ele acontece. A mediação, ao que tudo indica, será feita por Lucas de Matos, escritor e colunista literário, com quem também tive o prazer de conhecer e conversar.
Entre tantas apresentações potentes, destaco a sessão de fotografia de Amanda Tropicana. Suas palavras me emocionaram profundamente. Amanda compartilhou o impacto de ter lido Cartas para minha Avó, livro que a inspirou a retomar a faculdade de Antropologia na UNEB após pausar os estudos por conta da maternidade. Seu trabalho, apresentado na Wits, trouxe retratos comparativos entre Salvador e Maputo, revelando um olhar sensível e potente sobre os cruzamentos da diáspora africana.
Deixo também meus cumprimentos à dançarina Cátia Janaina Silva, que performou lindamente em homenagem às Yabás; à fotógrafa Letícia França; e ao pesquisador Luiz Pedra, que apresentam a exposição Ngongo — em cartaz na Universidade Wits e também no Instituto Guimarães Rosa, em Pretória.
Where We Stand é publicado pela Yale University Press e distribuído na África do Sul pela Jonathan Ball Publishers, maior editora do país. Agradeço profundamente a Shakti India e à equipe da Jonathan Ball pela forma respeitosa e afetuosa com que acolheram a obra. O livro será distribuído nas principais livrarias do país, e a editora também organizou uma agenda de imprensa. Fui entrevistada por vozes relevantes da cena literária sul-africana, como o podcast Cheeky Natives, de Dr. Alma e Letlhogonolo Mokgoroane, e pela renomada jornalista Jennifer Platt, do Sunday Times, jornal de maior circulação do país. Tive a alegria de almoçar com Platt, Shakti e Sandy, ambas da editora — mais um momento de trocas generosas e afetuosas.
Foram dias de muito axé. Deixo aqui minha gratidão ao embaixador Benedicto Fonseca Filho, um orgulho para a comunidade negra brasileira. Primeiro diplomata de carreira negro da história do Itamaraty, Benedicto tem uma trajetória que remonta à atuação de seu pai nas bases diplomáticas do Brasil. Sua história merece uma biografia. Cumprimento também toda a equipe da Embaixada, em especial Rodrigo Govedise e Daniela Malheiros, que atuaram na produção do evento. E reservo um agradecimento especial ao ministro-conselheiro Murilo Vieira Komniski, que, ao lado de sua esposa Paula e da filha Maria, nos acolheu calorosamente em sua residência. Jantamos juntos, conversamos noite adentro e encontramos sinergias raras. Murilo desenvolve uma carreira admirável no Itamaraty, e Paula é psicanalista, com pesquisa dedicada à travessia da maternidade — tema de sua tese de doutorado na UnB. Dessa passagem por Joanesburgo, saio com novos e queridos amigos.

Murilo, eu, Paula e Brenno
Na manhã do dia 19, cumpri o último compromisso desta etapa: uma aula no Departamento de Ciência Política da New York University em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos. Fiz um encontro online sobre Where We Stand, a convite da professora Cristina Buarque de Holanda e do pesquisador Leonardo Dias. Foi uma oportunidade de retorno simbólico, já que lecionei por seis meses na NYU em Nova York — sem nunca ter estado no campus do Oriente Médio. Por isso, esse convite me alegra duplamente: talvez seja o início de uma nova história entre Where We Stand e a região.
Agora, retorno brevemente ao Brasil para um compromisso que ainda não posso revelar. Mas no dia 25, o endereço está marcado: estarei na Livraria Travessa, em Lisboa, para uma única sessão de autógrafos. Vai ser um prazer reencontrar meu editor Zeferino Coelho, do Editorial Caminho, e atender à imprensa portuguesa. Depois disso, vou descansar por alguns dias — essa turnê merece esse desfecho.
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